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31 de março de 2019

Contra a Maré

Senhor Bennett se agachou para alcançála, mas Lydia se sentiu incapaz de olhá-lo nos olhos quando soube que ele estava se despedindo dela para sempre.

O senhor Bennett era a única pessoa que restava no mundo, a única que cuidava dela, e agora ela também ia perdê-lo. O professor pegou sua mão e apertou-a suavemente. 
— Vai ficar tudo bem—, ele disse muito devagar. — Você é uma garota muito inteligente. Os olhos de Lydia ficaram molhados quando ela o ouviu dizer que era uma garota muito inteligente. Porque naquele momento ela não se sentia uma garota inteligente; Ela se sentia fraca, assustada e solitária. Mas talvez o senhor Bennett estivesse certo. Talvez o orfanato fosse um ótimo lugar, onde ela seria capaz de aprender e encontrar uma nova família. Não demorou muito para ela perceber que não havia nada de bom no orfanato Crakken.

Capítulo Um

Qunize anos depois, 1891, Estaleiro naval de Boston
— Parece que a marinha russa lançou um novo navio de guerra —, disse Lydia.
Não era fácil afirmar a partir da fotografia, mas o navio parecia diferente dos outros navios que costumavam aparecer nos jornais russos. Lydia se levantou da escrivaninha e atravessou o escritório para mostrar o jornal a Willis, cuja memória enciclopédica para os navios era incrível. Ela só esperava que Willis estivesse disposto a ajudá-la. Lydia trabalhava no departamento de pesquisa da Marinha dos EUA há mais de quatro anos, mas Willis ainda estava chateado por terem contratado uma mulher para fazer esse tipo de trabalho. Lydia lhe emprestou uma lupa para que pudesse ver melhor a fotografia.
— Não me lembro dos russos terem uma torre giratória —, disse ela, — mas parece que sim, não acha? Willis Colburn era tão delgado que parecia que fatias de queijo podiam ser cortadas em suas bochechas afiadas. O jovem levantou os óculos enquanto estudava a foto.
— Sabe de uma coisa, Lydia? Se supõe que você é a especialista em russo, não eu —, disse ele com um tilintar. Na verdade, Lydia era especialista em russo, grego, turco, italiano, albanês e croata.
Seu trabalho era examinar jornais, relatórios técnicos e qualquer documento que tivesse sido enviado do sul da Europa para encontrar inovações no projeto dos navios. Quando viu a oferta de emprego solicitando uma pessoa que conhecia várias línguas e conhecia o mundo dos barcos em profundidade, esteve prestes a pular de alegria. Os primeiros dois anos depois de deixar o orfanato foram difíceis. Lydia teve que trabalhar em uma fábrica de enlatados, enchendo latas de cavala até quase desmaiar.
Era um trabalho monótono e nauseante, e no final da semana mal dava para pagar o aluguel do quarto. Por isso estava ansiosa para conseguir o emprego no estaleiro naval. Procuravam alguém capaz de ler documentos estrangeiros e entender as novidades no design dos navios. Lydia se lembrava de tudo o que tinha a ver com velas, bordado e o equipamento dos barcos de pesca, mas a primeira vez que viu as impressionantes fragatas de combate no estaleiro, perguntou-se se não superestimara seu conhecimento. Mas o almirante Fontaine não pareceu se importar.
Fontaine, um homem incrivelmente bonito, que parecia jovem demais para ser um almirante, encolheu os ombros. "Eu posso ensiná-la a distinguir navios de guerra, mas não dominar meia dúzia de línguas", disse ele. “Você está contratada”. Quem diria? A moça grega que crescera num barco de pesca caindo aos pedaços e nunca tivera um par de sapatos decentes trabalhava agora para um almirante da Marinha dos Estados Unidos. Todas as manhãs, Lydia passava em frente aos navios imponentes do estaleiro antes do trabalho.
O escritório tinha uma grande janela com vista para o dique, onde navios de guerra e outros navios eram verificados e reparados antes de retornar ao serviço. Lydia sabia que seu trabalho era extremamente importante.