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18 de junho de 2009

O Senhor do Vento




PRÓLOGO


Escócia,


As Lowlands (Terras baixas)

Fevereiro de 1305.

Uma chama de luz, seguida de uma escuridão aveludada, acalmou-a totalmente no mesmo momento em que começou a visão.
Isobel apertou com força os dedos sobre a cadeira que suportava seu peso e fechou os olhos. Viu que um homem surgia das sombras e caminhava para diante. Alto e de ombros largos, vestido com uma capa com capuz ao modo dos peregrinos, movia-se com a elegância de um guerreiro e o porte de um líder.
No punho protegido com uma luva levava um falcão.
Sua silhueta foi envolta pela neblina, e por fim desapareceu.
Isobel franziu o cenho, desconcertada. Nenhuma palavra, nenhum nome, nenhuma revelação acompanharam à visão; tão somente a vívida e intrigante imagem de um homem, já esfumada de tudo.
-Isobel? -A voz profunda e autoritária de seu pai, que se correspondia com sua impressionante altura e sua corpulência, soou deliberadamente atenuada.
John Seton falou como se estivesse no interior de uma igreja, mas se encontrava em seu dormitório olhando fixamente a sua única filha, a herdeira de sua propriedade do Aberlady, que profetizava de novo. - O que vê? - perguntou.
Ela moveu a cabeça negativamente e manteve os olhos fechados. Se os tivesse aberto, não teria visto a terrina de água pouco profunda que havia sobre a mesa nem a reluzente superfície em que se mostrou a primeira visão.
Não teria visto as paredes de pedra do dormitório de seu pai, nem o resplendor do fogo na chaminé, nem os três homens que a observavam com tanta concentração.
Estava cega. A escuridão de sua visão profética sempre lhe arrebatava a visão terrestre durante uma hora ou várias, às vezes durante mais de um dia.
Cada vez que lhe sobrevinha à cegueira, aguardava confiante até recuperar a visão; cada vez tratava de combater o medo de que um dia não voltasse a ver mais.
Deixou escapar um lento suspiro enquanto as imagens se formavam detrás de suas pálpebras.
Contando-se por miríades e rapidamente cambiantes, diversas caras e situações passaram ante ela como se as visse através de um cristal cintilante de várias facetas. Então tomaram forma as palavras, insistindo-a a falar.
-Traição – disse. - Assassinato.
Isobel percebeu murmúrios entre os homens que tinha perto: seu pai, seu sacerdote, seu prometido. Observou como se desenvolvia a cena e aguardou que chegassem novos descobrimentos.
-Que classe de traição, Isobel? - perguntou-lhe seu pai.
-Sim, o que é o que vê, Isobel? - Sir Ralph Leslie, o homem que seu pai lhe tinha eleito para marido, e amigo deste, possuía uma voz suave e agradável. Ouviu seus passos aproximando-se dela com um ruído pesado, pois se tratava de um homem baixo e corpulento.
E também ouviu como o azor que Ralph havia trazido consigo emitia um gorjeio desde seu cabide no outro extremo da habitação.
-Não te aproxime, Ralph - murmurou John Seton. - O padre Hugh está sentado junto a ela para ir escrevendo tudo o que diz.
-Não lhe faça perguntas. Deixe que nos ocupemos disso. E procure que seu azor guarde silêncio. Esse pássaro tem mal gênio.
Isobel ouviu sir Ralph lançar um grunhido a modo de resposta. Comprometeu-se com o Leslie no dia de Pentecostes, obedecendo os desejos de seu pai e de seu sacerdote. Esta era a primeira vez que sir Ralph a via pronunciar profecias, e ela compreendeu com tristeza, na zona periférica de sua mente, que ele não sabia como comportar-se durante a sessão.
Não tinha querido que Ralph estivesse presente, assim como tampouco tinha querido o compromisso, mas seu pai e o sacerdote tomaram a decisão, do mesmo modo que tinham tomado tantas outras que concerniam a ela. A sir Ralph lhe permitia observar, mas não podia distraí-la.
Isobel franziu o sobrecenho, deixando que seus olhos se movessem detrás das pálpebras em um intento de recuperar sua intensa concentração nas rápidas e vívidas imagens que se deslizavam através do escuro tecido de sua visão interior. O silêncio encheu a habitação, exceto pelo crepitar do fogo na chaminé.
-Vejo uma águia voando sobre colinas escocesas - disse.
Seguiu olhando enquanto as imagens passavam velozes, tal como acontecia sempre que se sentava para fazer uma predição a instâncias de seu pai.
-Uns falcões perseguem a águia - continuou. Suas visões com freqüência se desenvolviam em forma de uma mescla do real e o simbólico. Esta vez, seu dom parecia apresentar às aves de rapina como metáforas. Observou os pássaros, e sentiu que a alagava o entendimento.
-Há uns homens - disse com suavidade. - Um falcão da torre, um falcão do bosque, e outros. Escoceses e ingleses, que capturam um homem, a águia, de forma traiçoeira. É um líder ao que temem e desejam apanhar.