14 de agosto de 2017

A Dama de Companhia

Relançamento
Inglaterra, 1815

Salvo por um anjo apaixonado!
Seriamente ferido no campo de batalha, Kit Armstrong, conde de Hawthorne, voltou para casa para receber cuidados médicos. Mas como fazê-lo voltar à vida, se tudo que ele desejava era ter perecido no campo de batalha como tantos outros?
Chloe era apenas uma dama de companhia. Mas sua alegria quase juvenil, seu sorriso radiante mesmo diante das maiores adversidades e seu jeito amoroso fez com que os olhos de Kit Armstrong readquirissem o brilho então inexistente. Seria o amor o responsável por trazê-lo de volta à vida?

Capítulo Um

Christopher Armstrong, antigo membro da 20ª Cavalaria, permanecia em pé ao lado das janelas altas, e apreciava as cores brilhantes do outono de Yorkshire. Os bosques cerrados de carvalhos, faias e tílias vicejavam. Os gramados bem cuidados que se estendiam pela paisagem pitoresca. Era tudo dele. E aquilo não lhe dizia absolutamente nada.
— Hawthorne? — O som estridente da voz de sua avó quebrou o silêncio. Christopher estremeceu ao ouvir o nome que não lhe agradava.
— Meu nome é Kit — ele afirmou, sem se voltar.
— Isso é um absurdo! — a avó retrucou. — Agora, como conde de Hawthorne, não pode mais comportar-se como um simples plebeu rastejando atrás do comando de seu irmão! Além do mais, esta família é responsabilidade sua!
Kit não se moveu. Já ouvira aquilo várias vezes, desde que voltara para casa. Não se falava na sua carreira militar e nem na perda chocante de seu irmão. Nada. Era apenas a repetição constante de seus deveres. De certo modo, era como estar de volta ao Exército. Um corpo amorfo para ser usado em caso de necessidade.
Só que, nesse caso, em vez de entregar-se a seu país, tinha de sacrificar-se em favor da posição ilustre da família. Pelo menos, no entender de sua avó. Ele fora para a batalha com a mais honorável das intenções, mas não sentia nenhum entusiasmo pelos ornamentos duvidosos do poder político, da riqueza e dos privilégios. Nem tinha o menor interesse na continuação de uma pretensa dinastia que havia se reduzido a um ferido de guerra e uma velha ranzinza.
— O senhor me escutou? — ela gritou e bateu a bengala, para o caso de ele não ter ouvido.
Kit torceu os lábios, embalado por lembranças muito antigas. Houve tempo em que apenas o som daquele bastão atemorizava a ele e a seu irmão, nos dias longínquos e bucólicos da infância. Todos, até seu pai, se curvavam diante da famosa viúva que conservara o título do marido.
Mas, naquele momento, Kit via a avó como ela realmente era. Uma mulher envelhecida, zangada com o destino, e sem poder para mudá-Io. Ela acostumara-se a comandar a vida dos que estavam a seu redor e Kit a desapontara em todas as suas exigências. Ele se esforçara para conseguir sua patente em parte para contrariá-Ia. Mas acabara muito mais ferido do que ela.
Sua avó parecia ter sido feita de pedra. Kit nem mesmo saberia dizer se ela lamentava a perda de Garrett. Embora vestisse o luto necessário, ela não demonstrava tristeza. Ele não passava um segundo sem sofrer. Não somente por seu irmão, mas por todos os homens que serviram sob seu comando. Por todos os que haviam morrido no massacre sangrento de Waterloo. Por todos que haviam ido para a guerra, para nunca mais voltar.
E ali estava ele, não apenas vivo, mas supostamente próspero como o quinto conde de Hawthorne. Era mesmo uma ironia. Enquanto ele enfrentava batalhas e escapava da morte, Garrett, que permanecera em casa e em segurança, havia perdido a vida. Disseram que ele se cortara nos equipamentos agrícolas que sempre o fascinaram e morrera uma semana depois.
Era estúpido, sem sentido e insustentável. Kit nem se recordava de quantas vezes fora cortado por navalha e até mesmo por uma espada. Em Waterloo, fora atingido por um projétil e ficara esmagado debaixo de seu cavalo. O que lhe rendera costelas quebradas, numerosas contusões e uma perna proclamada imprestável. Ainda assim, Kit exigira que o engessassem. Com muito empenho e força de vontade, seu sofrimento deixara como consequência apenas uma leve claudicação.
Naquela altura, ele se perguntava de que lhe valera o esforço. Estava sendo medicado em Bruxelas, quando Garrett morrera. Embora a avó jurasse haver mandado um mensageiro, esse nunca o encontrara, por causa da grande confusão reinante depois de Waterloo.
Voltara para casa, para se recuperar, e a encontrara de luto. O funeral já terminara há muito tempo e sua avó estava determinada a fazê-lo substituir o irmão. Se ele não houvesse se alistado no Exército e enfrentado batalhas, poderia ser capaz de tomar o lugar de Garrett. Mas, então, não tinha estômago para suportar aquilo. Ele não se interessava por nada e nem queria ser um Hawthorne.
— O senhor precisa assumir o controle das propriedades!



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