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27 de dezembro de 2017

A Senhora do Caminho

Os rumores de guerra pairavam sobre o afastado vale do Svatge. 

Os homens deveriam ir ao combate e Arianne tem que contrair matrimônio. 
Seu pai acordou suas bodas, mas ela se nega a obedecer, embora isso lhe custe o desprezo de seu pai e a ira de seus irmãos.
O desafio sairá muito caro. 
Ver-se-á presa sem mais opção que ceder, ou desfalecer em seu cativeiro. Entretanto, o destino dará uma volta e um novo pretendente exigirá sua mão e não admitirá desculpas.  Os enfrentamentos acontecerão entre ambos em um duelo entre atração e repulsa, paixão e dor, orgulho e amor.   Enquanto o reino treme atacado pelas intrigas, em Svatge articula-se outra dura batalha para conquistar o coração de Arianne.

Capítulo Um

O vento chegava do leste naquela noite.
Era menos gelado que o do norte mas também frio e fazia com que os clarins que anunciavam a mudança da guarda soassem longínquos e apagados. Eram muitos os muros que mediavam entre o pátio de armas e aquela esquina da muralha onde ela encontrava-se. Uma esquina onde o vento açoitava, com especial crueldade.
Arianne aconchegou-se mais em sua capa e deixou que o quente contato do arminho acariciasse seu pescoço. Fora estupidez dizer que não sentia frio. Acabava de começar o outono, mas naquele árido vale rodeado de montanhas, o inverno chegava antes que desse tempo de saborear o breve tempo de trégua.
O certo era que o frio não a incomodava, muito.
 Arianne estava mais do que acostumada a ele. No castelo os muros e mesmo o piso, eram de pedra, e os lugares não ficavam, jamais, aquecidos por mais lenha que se colocasse nas lareiras. 
O frio fazia parte dela, desde que tinha lembrança na memória. E em todo caso, que o inverno chegasse pontual, ano após ano, era algo que não dependia de Arianne e que por mais que odiasse-o não podia solucionar. Não, não era o inverno o que a preocupava naquela noite, ou ao menos, não só isso. Se fosse somente o inverno…
O vento trazia também outras vozes. Clamores de guerra e entrechocar de espadas. Levantava-se como um rumor surdo, mas crescente, e varria todo o reino e seus caminhos, das desertas planícies geladas de Langensjeen até as cálidas praias de Tiblisi, lá longe, no sul.
Era daquela região, que somente sabia-se o que contavam as canções dos histriões, que provinha o ramo materno de sua família, embora sua mãe tivesse nascido e criado-se no oeste, na corte. 
Possivelmente Arianne herdara dela essa desacostumada sensibilidade às baixas temperaturas, a qual os naturais de Svatge estavam, mais, que habituados. 
Sendo ou não esta a causa, Arianne a suportava tão estoicamente como os demais, e aquele violento vendaval não incomodava mais do que as primeiras nevascas, já muito próximas, incomodariam aos lobos, que neste inverno, como em todos os outros invernos, sairiam dos bosques para rondar por granjas e vilas, em busca de um alimento, que escasseava para todos. Ao menos, para todos os que não gozavam do amparo do castelo.
Os lobos, a fome e o frio… Como se esses não fossem já suficientes maus para que, por outro lado, os orgulhosos e néscios cavalheiros enfrentassem-se sem trégua, entre eles, e arrastassem à guerra, a tantos outros, atrás de si. 
Aldeias arrasadas, campos de cultivos queimados, pequenas cidades e vilas tomadas a sangue e fogo, somente pela absurda cobiça, o afã de saque e poder de poucos, com frequência vilmente justificados por antigas rivalidades que não faziam mais que crescer, com cada enfrentamento. 
O certo, era que Svatge não tinha motivos para preocupar-se com os saqueadores. Não era um vale fértil e generoso. Em suas ravinas só cresciam coníferas e lilases. Mais acima, ao norte, a terra era dura, também, e o inverno até mais extenso, mas sob suas montanhas encontravam-se as minas.
Minas e minas, montanhas inteiras forjadas em prata. Tanta, que dizia-se que os senhores daquelas terras possuiam palácios inteiros construídos nesse metal. Não, ali não havia prata, nem as terras eram férteis e proveitosas como no sul. O único valor que Svatge realmente possuía era o caminho. 
Assim fora sempre. O castelo de Svatge custodiava o único caminho existente em muitas milhas sobre o Taihne, um rio caudaloso, profundo e traiçoeiro que dividia o reino de Ilithya em dois. 
Era o caminho mais curto para chegar ao Ilithe, se algum assunto te requeresse na corte, a não ser que tivesse um navio a sua disposição e atracasse por mar, ou te aventurasse a confrontar os redemoinhos do Taihne em barcaça, ou estivesse disposto a cavalgar longas semanas através de estreitos atalhos de montanha.
Em qualquer dos casos, nenhuma dessas alternativas era a mais adequada para um acompanhamento numeroso, assim, se algum senhor desejasse fazer uma demanda ao rei e para isso se fizesse acompanhar de muitos de seus vassalos armados, antes, precisava contar com a benevolência dos Weiner. 
É que Svatge não era outra coisa, que uma fortaleza militar, uma última linha de defesa, sempre leal ao rei, porque do rei e do reino vinham todas as coisas boas das quais Svatge desfrutava.