Há ofensas que congelam a alma.
Um longo e insólito ano de inverno, May Baker e Edgard Hambleton contraem matrimônio em questão de semanas por diferentes razões, entre as quais não está incluído o amor. Ela deve silenciar os rumores que a marcaram desde que seu noivo se casou com outra. Ele, por sua vez, está determinado a levar a cabo uma vingança que o queima por dentro.
Como o tempo, a frieza se estende sobre eles desde o dia de seu casamento e, talvez, já seja tarde para a primavera.
Capítulo Um
May estava com o rosto colado nas vidraças da janela do seu quarto, como se assim pudesse sentir sobre sua pele a chuva fina que tamborilava do outro lado. O céu tinha a cor de sua alma e naquele dia sentia que tudo era de um cinza escuro e implacável. Seus olhos castanhos permaneciam secos, mas seu orgulho ferido chorava por dentro.
A Sra. Baker entrou sem avisar no quarto de sua filha acompanhada de uma criada com uma bandeja cheia de frutas e presunto.
— Não pode passar os dias assim, filha. Tem que comer algo — comentou ao ver sua filha como uma flor murcha.
— Não tenho fome, mãe.
A criada depositou a bandeja sobre uma mesa e deixou as duas mulheres sozinhas.
— Já não se pode fazer nada — acrescentou a Sra. Baker quando a porta se fechou —. Deveria fingir que não se importa. Do contrário, só alimenta os mexericos.
— Fingir que não me importa, mãe? — Se incomodou May —. Pode-se fingir depois do ocorrido? Por acaso acha que alguém acreditaria que sou feliz, mesmo que soubesse fingir?
— Acha melhor se trancar e parar de comer? Está assim há quatro dias! Você sabe o que murmuram as pessoas?
— As pessoas murmurarão iguais porque tem motivos para isso, mãe. Meu noivo se casou com outra, acredita que as bocas vão ficar fechadas por mais que eu coma ou saia de casa como se não fosse nada?
— Mas assim dá a eles incentivo, May. E não só me importo com os comentários e boatos, você me importa. Viu como está abatida?
— Faz dias que está chovendo. Por acaso isso não é desculpa para me manter em casa?
— Nem sequer quis descer para cumprimentar Elliot e Frances quando vieram ver como estava.
O Ano do frio – Jane kelder
— São meus primos, mãe. Se vieram com boas intenções, devem me entender.
— “Se vieram com boas intenções...”. Que maneira de falar é essa!
— Já sabe que, desde que se casou com Weaver, Frances se mostra mais arrogante.
— Verdade que Weaver é um bom partido, mas ela é sua prima e não acho que isso mudou seu amor por você.
— Então se seu amor por mim não mudou, deveria respeitar minha privacidade.
— Ah! Está impossível!— Disse enquanto se sentava sobre a cama e olhava sua filha com pena —. Estava apaixonada por ele, May? Pensei que tinha aceitado esse casamento como teria aceitado a proposta de qualquer outro cavalheiro recomendável.
— Não, não estava apaixonada, mas o respeitava e me sentia bem na sua companhia — respondeu como se negasse a possibilidade e, ao ver a expressão preocupada de sua mãe, saiu da janela e se aproximou dela —. O considerava agradável, mas não me doeu tanto que se casasse com essa Senhorita Curtis como o fato de ter-me inteirado por outras pessoas. Devo lembrá-la, mãe, que ainda não rompeu o compromisso comigo. Que não veio me enfrentar e nem sequer enviou uma mísera nota. Se não tivesse sito pela Senhora McGregor, ainda estaria sonhando com meu casamento.
— Então, apenas está ofendida. Isso é menos grave do que um coração partido. — Se tranquilizou a Sra. Baker —. E não acho que nesse momento possa desfrutar do seu respeito.
— E você não está ofendida? — Perguntou como se a reprovasse.
— Claro que estou ofendida!