Sofía é de berço nobre, mas recebeu uma educação pouco convencional.
Tem passado toda sua vida em um pequeno povoado da Cornualha, muito unida a seu irmão gêmeo, mas em solidão, isolada da sociedade.
Inesperadamente, um trágico acidente no mar muda sua vida para sempre. Será resgatada por um atraente capitão de coração vingativo.
Poderá a jovem lhe demonstrar que o amor é mais importante do que a vingança? Poderá mudar um homem que se crê incapaz de amar?
Capítulo Um
Inglaterra, 1790.
― Isso é brigar sujo!
― Não se queixe tanto e defenda-se.
Voltou a lhe atacar com seu florete e seu irmão o desviou como pôde.
― Nunca deveria ter permitido compartilhar minhas lições de esgrima com você.
― E com quem praticaria? O que acontece é que está com ciúmes. Sou melhor espadachim que você.
― Porque utiliza artimanhas para me desarmar. Os cavalheiros têm um código de honra e você se atreve a ignorá-lo. Como pôde me dar uma rasteira?
― Recorde, irmãozinho, eu não sou um cavalheiro.
― A culpa é minha. Não se pode confiar em uma mulher e muito menos em você, querida.
Sofía Campbell voltou a atacar seu irmão Alfonso, e este deu um passo atrás. Encontravam-se em um prado, dentro das propriedades de seu pai, o conde do Hawsley, praticando esgrima como em todas as tardes. Eram gêmeos e, embora sempre estivessem discutindo, queriam-se com loucura e cuidavam-se mutuamente. Assim, tudo o que tinha aprendido, Alfonso o tinha ensinado a sua insistente irmã — tanto latim como montar a cavalo — e, embora ele às vezes se queixava de que Sofia se saísse melhor, não podia evitar sentir-se orgulhoso dela. Viviam na casa da família, na Cornualha, durante todo o ano, sem assistir aos eventos sociais. Quem unicamente tinha insistido em viajar a Londres para as temporadas tinha sido sua mãe Isabel, mas desde que ela havia falecido, quando eles tinham dez anos, ninguém havia tornado a sair dali, e o conde ficava ausente na maior parte do tempo.
O matrimônio de seus pais tinha sido por conveniência e, para descontentamento do conde, Isabel não tinha sido a dócil dama espanhola de alta linhagem que lhe tinham prometido seus pais. Assim que casou-se não houve festa a que não assistisse e nenhum homem que se livrasse de seus encantos. Para desgosto de seu marido, insistiu em pôr nomes espanhóis em seus filhos. E para maior ofensa, seus descendentes resultaram ser tão indomáveis quanto sua progenitora. Ambos falavam espanhol com fluidez graças à teimosia de sua mãe em falar sempre naquele idioma. Alfonso se parecia fisicamente com a mãe, com o cabelo castanho e os olhos escuros, mas com um temperamento tranquilo, mais parecido com o de seu pai; justamente o contrário de sua irmã, que era impetuosa e fisicamente parecida com o ramo familiar inglês, com um cabelo loiro escuro e os olhos verde jade. Embora, ainda que de longe parecessem dois cavalheiros combatendo, de perto podia-se apreciar a feminilidade da jovem. Tinha seu comprido cabelo recolhido em uma trança e, para desgosto dela, as calças e a camisa faziam destacar mais as suas curvas.
Com uma finta, Sofía conseguiu desarmar seu irmão; o florete saiu voando e Alfonso caiu para trás.
― Renda-se e admite que sou melhor que você ― disse, apoiando no pescoço dele a ponta do florete com o protetor.
― Isso nunca!
Enrolou suas pernas com a dela, e com um empurrão Sofía se encontrou caída na erva ao lado de seu irmão.
― Oh! Alfonso, olhe quem fala de brigar sujo!
Ambos riram, mas interromperam as risadas de repente para ouvir um ruído procedente do caminho. Endireitaram-se e observaram uma carruagem aproximando-se da mansão.
― Não tinha previsto vir só dentro de dois meses?
― Já sabe como é o pai; as datas em suas cartas são mais orientativas. Sempre adianta ou atrasa sua volta a seu gosto.
― Tal como aos dias de sua estadia, que sempre resultam ser de menos do que diz e nunca de mais.
― Pensei que já tinha superado essa etapa…
― Certo, já não sou uma menina ansiando a volta do pai para que me dê uns tapinhas na cabeça e me diga quão bonita sou. Agora, aos meus vinte anos, posso ver a realidade tal qual é. Não se importa conosco e jamais o fará.
― Somos seus filhos... Não pode nos ignorar, embora o tente. Acaso não tem que pagar nossas faturas?
― Recorde que estuda em casa porque o pai pensou que seria esbanjar dinheiro se o enviasse a uma escola e depois à universidade como o resto de seus amigos?
― Algo que lhe estaremos eternamente agradecidos, não opina igual?
― Sim, não poderia ter suportado estar longe de você e ficar escondida neste mausoléu.
Sofía apertou-lhe a mão carinhosamente, voltou a vista à casa e lhe sorriu com troça.
― Desafio-o para uma corrida.
Antes que Alfonso pudesse reagir, Sofía corria para sua égua, que pastava placidamente junto à de seu irmão. Subiu de um salto e a esporeou. Ele a imitou, mas embora pelo caminho tenha conseguido ultrapassá-la, o primeiro a chegar aos estábulos foi ela.
― Não se cansa de perder sempre pra mim?
― Deixa de brincadeiras e vá se trocar antes que ele a veja. Não queremos pôr um lenço vermelho diante do touro, não?
― Nem se daria conta.
― Você crê? Recorda como ficava com a mãe.
― Oh, por Deus! Não compare! As coisas que ela fazia eram muito piores, nem eu as posso justificar.
― É melhor que sejamos precavidos. Se não está casada é porque conseguiu passar despercebida, mas se o irrita em algum momento…
― Oh, está bem! Como se não preferisse um vestido a esta ridícula indumentária.
Seu irmão não entendeu o comentário como tampouco viu o olhar apreciativo do moço para o traseiro de sua irmã, mas esta foi incomodamente consciente dele.
Assim que chegou a seus aposentos, encontrou-se com sua criada Elvira, que tinha vindo com sua mãe da Espanha, já com o vestido preparado.
― Supus que gostaria de algo singelo.
― Tudo que seja preciso para que meu pai não se lembre de que cresci. Como muito bem me lembrou meu irmão, é um milagre que ainda não tenha comentado nunca nada comigo sobre matrimônio.
― A verdade é que já está na hora de se casar. Mas tampouco quero vê-la casada com um homem que seu pai escolha.
― Eu não quero me casar nunca.
― Oh, não seja mentirosa! No fundo sei que é uma romântica. É só vê-la com os meninos do povo. Seria uma mãe maravilhosa. Mas você precisa casar-se por amor, está tão carente disso…
― Não necessito amor.
― Necessita sim. Além disso, não quer estar sozinha para sempre, não?
― Não estarei sozinha, tenho a meu irmão.
― Mas o senhorzinho não vai estar sempre a seu lado. Ademais, alguém pode sentir-se só mesmo estando rodeada de gente, não é verdade?
Seu olhar ficou fixo no espelho, enquanto Elvira lhe abotoava o vestido nas costas. Não podia negar suas palavras. Fazia algum tempo notava um estranho vazio que não sabia como preencher. Além disso, sentia certa inveja por suas vizinhas e amigas, que estavam todas casadas, muitas já com filhos. Em especial de sua melhor amiga, a filha do vigário, pela maneira como a olhava seu recente marido… A ela nunca tinham olhado assim. Com luxúria sim, desgraçadamente muitas vezes, mas com essa admiração, essa devoção, esse… amor, não, nunca.
― E infelizmente aqui não abundam os cavalheiros. Os poucos que há já estão casados ou são muito velhos para você. Embora sendo realista, nenhum deles poderia aspirar a casar-se com a filha de um conde.
― Crê que minha posição os manteve afastados? ― perguntou com certo tom desalentado, que sua criada notou e, insistindo para que se sentasse na penteadeira para penteá-la, olhou-a com carinho.
― Não se preocupe, o homem para você aparecerá cedo ou tarde.
Tomara que seja logo…