Harmony George viveu metade de sua vida sob os cuidados de um par de tios apáticos e mesquinhos.
Seu único refúgio, um livro censurado pela boa sociedade que narra as viagens de um viajante intrépido, o inspira a buscar seu destino em outras fronteiras, uma vez que atinge a maioridade e tem acesso a sua modesta herança. Infelizmente, seus tios conceberam um futuro muito diferente para ela, casando-a com o jóquei mais obsceno e chocante de toda a Inglaterra.
Quando ela se vê noiva de tal malandro e também descobre que seu tio usou sua herança para pagar dívidas antigas, seu sonho acalentado começa a se desfazer. Horrorizada por um futuro sombrio, Harmony está determinada a escapar, no meio do baile de Natal, para imitar sua heroína, Ida Pfeiffer, que com apenas um punhado de libras iniciou a jornada de sua vida. Devlin Sawyer, o Duque de Waldegrave, não pode esquecer Vitória, Baronesa Lovelance, que o deixou para correr atrás de seu verdadeiro amor, razão pela qual ele recorreu à bebida e a uma atitude repelente para com o resto do mundo. Enquanto ele fica bêbado nas sombras do jardim da Felton House, seus olhos distinguem uma garota que escalou corajosamente a cerca, a sobrinha taciturna e pouco atraente do homem que o enganou. Devlin nunca suspeitou que ir atrás dela mudaria sua vida para sempre.
Capítulo Um
Hampstead, Londres, Inverno de 1880
Um cobertor precoce de neve cobria os jardins da propriedade ducal em Waldegrave Terrace. Em questão de horas, a tempestade que atingiu a meia-noite havia engolido os campos cortados, cobrindo as colinas de Hampstead Heath até onde os olhos podiam ver. Os pinheiros imponentes, com seus galhos bronzeados por pingentes de gelo, destacavam-se na incipiente luz da manhã. O vento os balançava com um balanço suave, sacudindo seus galhos, espalhando ogranizo com uma chuva implacável. Mas nem todo o frio daquelas terras era comparável ao da disposição de seu mestre.
Com uma abstração quase insana, Devlin Sawyer, parado em frente à lareira espartana na sua sala, olhou para a madeira em brasa da lareira até que viu derreterem em cinzas. Na escuridão tórrida da sala, alarmante na noite anterior. Seu corpo e mente, no entanto, resistiam ao conforto de uma compulsão. A raiva o manteve sóbrio. Ciúme e um coração cuja ruptura nunca admitiria em voz alta batiam dentro dele em uma espiral de dor.
Algumas horas atrás, sua mansão havia sido palco de um suntuoso baile de caridade; Centenas de personagens ricos e influentes desfilaram por seus salões, beberam até ficarem fartos das melhores garrafas de seus porões. Os criados os encheram de comida requintada. Fazia muito tempo que Waldegrave Terrace não via tal comemoração, talvez desde a época do velho duque.
Os jornais não economizaram em adjetivos para elogiar a noite. A essa altura, boa parte dos convidados dormia nos quartos, e outros se reuniam à mesa do café da manhã para discutir os bastidores do baile ou rondar a mansão em busca de alguns restos de álcool. Ele, por outro lado, havia apenas definhado naquele refúgio isolado. Sua mente repetidamente repetia as palavras da mulher que o abandonara depois que a noite terminara. A mesma a cujos pés ele colocara o mundo inteiro pela última vez... A mulher com a qual pretendia propor casamento no final da noite.
Devlin desejou ser capaz de odiá-la por dar aquele golpe certo, mas, segundo as coisas, isso era improvável. Victory Brandon, a viúva Lovelance, entrara em suas veias como uma droga implacável e seus encantos o transformaram no despojo de um homem que ela agora sabia que ele era.
Ele chegou a pensar que a amava, e isso o levou a repensar a ideia de se relacionar com uma mulher, quando tinha evitado isso a vida toda. E tudo para quê? Para que ela rechaçasse suas atenções como um chicote desumano, direto para a alma. Para acabar sendo um pobre diabo desprezado, assim como aqueles conhecidos dele que sempre o exasperavam com suas sombrias histórias de amor. Tudo para entender que ele não era ninguém para a única mulher que tinha tido sua atenção. A única que tina conseguido lhe colocar de joelhos.
Ele, um maldito duque, pensou ao tomar o último gole de conhaque. Detentor de um dos títulos mais antigos e reverenciados da Inglaterra, não era ninguém para ela, que preferia os favores de um conde vulgar, que até recentemente estava à beira da mendicância.
A raiva que o consumia o forçou a jogar o copo contra o fundo da lareira. Foi uma colossal perda de tempo toda aquela montagem ridícula, os esforços para que seus conhecidos fossem ao baile, para deixar quantias enormes nas mesas de apostas e se comprometerem a ser benfeitores da Fundação Mary Alice Bird para viúvas necessitadas de toda a Grã-Bretanha, que Lady Lovelance havia fundado, e que apoiava com os olhos fechados.
— Ela se aproveitou de mim, — pensou antes, mas depois descartou a ideia quando percebeu que ninguém altruísta o suficiente para estabelecer um lar para viúvas pobres deveria ser acusado de ganância. Isso o deixou de mãos atadas, sem nada para censurá-la, o que aumentou sua frustração. Mal havia manifestado seu desconcerto após os fogos de artifício que terminavam a noite, quando Victory pediu que ele cessasse sua intenção de conquistá-la porque seu coração tinha um dono. Devlin a questionara sobre isso e ela acabou confessando que estava se referindo a Casper Pleydell-Bouverie, o conde de Radnor.
Apenas por lembrar, sua necessidade de bater em alguém explodiu.
Um barulho na porta desviou sua atenção da madeira carbonizada e dos pensamentos furiosos. Limsey, o velho mordomo da mansão, entrou solenemente no escritório. O rosto enrugado e pesado do homem refletia sua preocupação depois de saber com as criadas, que seu mestre havia passado as últimas seis horas lá.
— Bom dia, Excelência, — disse ele depois de pigarrear.
Devlin não respondeu. Ele mal fez uma careta para avisá-lo de que não era bem-vindo. Atrás de Limsey, uma empregada entrou carregando uma bandeja de prata. A garota, mais quieta e mais rápida que um réptil, deixou o pacote na mesa onde o falecido pai de Devlin costumava tomar café da manhã.
— O que é isso? — Ele perguntou irritado.
— Seu café da manhã, — o mordomo se apressou em responder.
— Eu não pedi nada, Limsey.
— Claro senhor, ousei trazê-lo. — Supus que…