Phillip Kensington, marquês Huntley, foi ferido e dado como morto antes de ser descoberto e levado a uma abadia próxima para recuperar-se.
Tinha sido um bêbado, uma desgraça, e a ruína de mais de uma mulher decente. Mas não demora para ver-se reformado, e apaixonado por uma mulher que não pode ter. Ângela Sullivan planejava dedicar sua vida a um homem celestial e imortal. Em troca, vê-se cuidando de um diabolicamente belo canalha, que provoca sentimentos que acreditava ter dominado fazia muito tempo. Odeia seus célebres pecados, mas nunca contou apaixonar-se profundamente pelo pecador. Seus passados não demoram em alcançá-los, e uma segunda oportunidade ao amor parece ser muito a se esperar. Aí é quando intervém lady Palmerston, uma parente longínqua de Ângela, com seu próprio e negligente modo de se conduzir como acompanhante e que deve assegurar um final feliz para as duas pessoas que a sociedade espera ver casadas.
Capítulo Um
Abadia de Stanbrook, Sussex, Inglaterra, setembro de 1821
Ao abrir os olhos, Phillip não reconheceu o que viu. Uma luz estranha e sedosa lhe deslumbrava. Deu-se conta de que tinha amanhecido. Não era capaz de recordar quando tinha sido a última vez que tinha visto a luz da manhã. Para ele, era um espaço de tempo que passava dormindo atrás de cortinas de veludo, depois de ter estado toda a noite bebendo, jogando cartas e em companhia feminina. Piscou até que seus olhos se acostumaram à luz. O que fazer pela manhã? «Tomar o café da manhã» recordou, dando a volta na cama e encolhendo-se de dor.
Procurou a campainha para chamar o serviço. Os músculos do braço e o peito lhe doíam. Procurou em vão pela campainha. Não havia! Como ia comer se não podia chamar a nenhum criado? Iria morrer de fome. Phillip se voltou uma vez mais na cama para deitar-se de barriga para cima, algo que lhe resultou bastante doloroso. Que diabos teria feito? E onde demônios estava? Jogou uma olhada ao lugar onde se achava: pelo estreito que era, certamente se tratava de uma cela. Estava em um cárcere.
As paredes e o chão eram de pedra cinza. Havia uma porta e na parede oposta uma janela, pela qual se via o céu. Não havia tapetes nem cortinas, nem nada que não fosse estritamente necessário: a estreita cama sobre a qual jazia, uma mesinha de noite e uma cadeira, ambas de tão má qualidade que Phillip se perguntou se eram obra de algum carpinteiro bêbado. Fim do inventário.
Esse lugar não tinha nada a ver com nenhuma das casas que tinha ocupado em seus vinte e nove anos de vida. Cliveden, a residência ducal onde tinha passado sua juventude, tinha conhecido épocas melhores, mas ao menos conservava os tapetes em todas as habitações. E o apartamento de Paris, do qual tinha fugido recentemente — isso sim recordava, — embora pequeno, — só dez habitações — estava decorado com um gosto requintado. Inclusive a habitação da donzela tinha cortinas. Não deixava de se perguntar onde diabos se encontrava.
Não podia sair de suas dúvidas porque faltava a ditosa campainha. Sem ela não podia chamar um criado para que respondesse suas perguntas. Phillip acabou por chegar à conclusão de que não tinha conseguido livrar-se de seus perseguidores. Ao tratar de recordar o que tinha acontecido, começou a sentir uma dor aguda na cabeça.
Tudo que se lembrava era da escuridão fechada da noite, do som constante dos cascos dos cavalos e da chuva fria que lhe golpeava a cara impregnando-o até os ossos. Recordava estar olhando de maneira constante para trás, para ver se pôr fim os tinha despistado. Depois disso, não recordava mais nada.
Tendo em conta a dor que sentia e a espécie de cela em que se encontrava, tinha chegado à conclusão de que o tinham alcançado. Mas estava muito cansado e dolorido para pensar nisso agora. Nem sequer ficavam forças para preocupar-se pelos passos que às vezes se ouvia no corredor, passando diante de sua porta. Seu interesse despertou quando viu entrar no quarto, uma mulher com uma bandeja na qual esperava que houvesse comida. — É um anjo.