Inglaterra, 1886.
A morte rondava os desventurados de Londres naquela noite de dezembro, mesmo os que tinham a sorte de contar com um teto sobre suas cabeças. Mas, apesar do frio, em uma das muitas pequenas vilas de imigrantes em White Chapel, um pequeno grupo de amigos reunia-se no pátio, próximo à janela da moribunda. Ali, onde tantas culturas se misturavam e nem sempre homogeneamente, senhoras idosas vestidas de preto, crianças, jovens e adultos rezavam, cada um em sua própria língua e religião, por aquela alma tão querida. Todos sabiam que aconteceria em breve, e a tristeza marcava os rostos amigos que faziam a vigília. O médico, por fim, saiu do pequeno cômodo, olhar contrito, o chapéu nas mãos.Anne Thèrese Templeton não mais estava neste mundo. As pessoas que moravam naquela vila, crianças e velhos, jovens e adultos, de repente, sentiram-se órfãos.No entanto, ninguém ali, eles tinham certeza, sentia-se mais triste do que a jovem filha de Anne.A pequena multidão abriu passagem para a moça que saía correndo da casa. A menina a quem chamavam carinhosamente de Amie. Ela correu sem direção pela noite de Londres, não sabia para onde estava indo e nem se importava. Queria apenas se afastar daquilo tudo.
Capítulo Um
Londres, 1888.
Quando a Sra. Howard fora chamá-la em seu quarto, dizendo que alguém desejava vê-la, Ártemis Templeton franziu o nariz, já antecipando o que lhe esperava: um velho, pomposo e rabugento mordomo, cheirando à água de colônia, que viera em nome de seu senhor, o lorde qualquer-coisa, para contratá-la. Nunca era muito diferente disso! Mas, mesmo diante de tal perspectiva, ela tinha de receber a pessoa. Depois que os Stratkery haviam se mudado para Kent, ela ficara desempregada, e, em pouco tempo, também ficaria sem dinheiro. A Sra. Howard era muito boa, mas dependia dos aluguéis para viver. Também não podia voltar para a vila, pois lá, não a deixariam pagar por suas despesas, o que Amie não considerava justo.
Seguida de perto pela dona da pensão, desceu a velha escada de madeira rumo à sala de visitas. Involuntariamente, parou por um instante na porta, para observar o visitante que, distraído, olhava a rua movimentada pela janela. O jovem negro, medindo quase dois metros de altura, virou-se e sorriu antes de tomar-lhe a mão para beijá-la polidamente.
—Jesus dos Reis, senhorita. Secretário pessoal do conde de Hallen. Muito prazer em conhecê-la.
Ele tinha traços bonitos, fortes, acentuados pela cabeça raspada e as roupas impecáveis. Seus olhos eram incrivelmente verdes.
—O prazer é meu, senhor. Sente-se, por favor.
—Creio que sabe por que estou aqui, miss Templeton.
—Acredito que seu patrão esteja interessado em meus préstimos como dama de companhia, estou certa?
—Exato. Sua Graça tem uma sobrinha que mora com ele desde o falecimento de sua irmã e o marido...
—Ouvi falar do acidente...
—O caso é que a babá de Ethnee decidiu nos deixar, e precisamos de alguém para substituí-la.
—Compreendo. – Então ela olhou-o nos olhos e disse: - Permite-me uma pergunta, senhor?
—Mas é claro!
—Tenho algum motivo para me preocupar com esta partida repentina da antiga governanta?
Os olhos do secretário arregalaram-se momentaneamente e, depois, ele riu.
— É uma pessoa franca, miss Templeton! De forma alguma. Ethnee é uma menina extremamente doce e bem educada.
—Entendo, e quanto ao conde? – Amie se permitiu sorrir também.
—Não terá de se preocupar com Sua Graça, miss Templeton. Lorde Hallen é recluso e raramente deixa sua biblioteca.
—É uma pena. Sua presença deve fazer falta à pequena lady.
O S. rDos Reis pigarreou e desviou o olhar do dela, não querendo fazer qualquer comentário que desabonasse seu patrão e bom amigo, mas tinha de admitir que concordava com a moça.
—O conde recebeu ótimas referências suas, senhorita, e espera que esteja pronta para assumir seu cargo imediatamente.
—Com toda a certeza, Sr. Dos Reis!
—Ótimo, não esperávamos menos da senhorita. – Ele se levantou encerrando a visita. – Sua Graça a espera amanhã, às oito horas. Um coche virá buscá-la.
—Como o senhor quiser. Até amanhã.
Ele fez uma breve reverência e saiu, acompanhado pela dona da pensão.
—Que homem encantador! Muito distinto, não?
—De fato.
—Uma pena o conde de Hallen viver isolado, não acha? Era um homem tão bonito...
Stefani Banhete, nova escritora brasileira,
vamos prestigiar.
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Oiii você não vai sair sem comentar nada vai? Ou que tal indicar o que leu. Ou então uma resenha heheheheh...Todo mundo agradece, super beijo!