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7 de fevereiro de 2010
A Águia e o Anjo
O cavaleiro mercenário Sir Garren devia muito a William, Conde de Readington: a espada que o protegia, o cavalo que montava, até mesmo seu título de nobreza.
Por sua vez, Garren salvara a vida do Conde na Terra Santa.
Mas William fica gravemente enfermo quando retornaram.
E cabe a Garren salvá-lo novamente a qualquer custo: mesmo que isso signifique fazer outra peregrinação e rezar por um deus a muito abandonado, prometendo deflorar uma jovem dama inocente caso seu senhor se recupere da doença...
E Garren já fizera sua escolha para o sacrifício: a religiosa Dominica, para quem Sir Garren era um sinal dos céus.
A peregrinação, abençoada com a presença do belo e heróico cavaleiro, certamente era uma orientação para que ela tomasse o hábito. A cada passo da jornada, porém, Dominica parecia se desviar um pouco mais de Deus e ir diretamente para os braços de Garren.
A ponto de começar a se perguntar se sua verdadeira missão não seria abrir o coração frio do mercenário para o verdadeiro amor.
Será que o beijo de Dominica teria mais poder do que as armas de Sir Garren?
Capítulo Um
Castelo de Readington, Inglaterra, junho de 1357
— Deus me trouxe de volta dos mortos, Garren — disse William. — Você foi Seu instrumento.
Garren fitou o amigo, deitado em seu leito. Quando William, Conde de Readington, estava no campo de batalha em Poitiers, Deus não levantara um dedo.
Agora, Garren se questionava se devia ter feito aquilo. Talvez a morte em solo francês tivesse sido melhor para ele.
Pela vida de William, contudo, Garren lutaria até com Deus o tempo que fosse necessário.
— Você foi o único — disse William. — Os outros me deixaram lá para morrer.
Mas William não estava morto, mesmo tendo havido dias em que Garren não tinha certeza disso. Depois que as tropas vitoriosas caminharam por toda a França e, finalmente, navegaram de volta para a Inglaterra, William começou a viver um purgatório na terra; mantinha-se vivo porque Garren forçava-o a engolir água, mingau e carne moída.
— Sou teimoso demais para abandoná-lo.
— Mais que isso. — Entre cada palavra, William ofegava para respirar. — Você me carregou. Nas costas.
— Você e sua armadura. — Garren sorriu, os lábios apertados, e simulou um soco no ombro de William. — Não esqueça a armadura.
Os Readington regozijaram-se mais com o retorno da armadura do que de seu dono. Enquanto o resto dos cavaleiros ingleses voltava para casa com os produtos dos saques, Garren limitou-se a trazer William.
Para carregá-lo, deixou para trás as riquezas que tinham sido a promessa da campanha francesa.Tudo parecia valer a pena à medida que William recuperava as forças.
Porém, nas semanas que se seguiram ao seu retorno, os vômitos começaram.
Alguns dias estava melhor, outros pior.
Agora, William estava deitado em um leito de morte. Durante o dia, sua cor variava entre o vermelho e o marrom, de uma extremidade a outra.
Os criados trocavam os lençóis, uma tarefa vã, contudo um sinal de respeito.
Não tinham muito mais a fazer.
Pelo menos, pensou Garren, William poderia morrer em sua própria cama.
— Preciso pedir mais... uma... coisa... — Seus dedos frios agarraram os de Garren com a força da morte.
Dei-lhe a vida, o que mais posso fazer? Pensou Garren. Mas, quando fitou William, com pouco mais de trinta anos, e incapaz de se levantar da cama, teve dúvidas se o seu presente de vida havia sido tão valioso, afinal.
— Vá à peregrinação para mim. Peregrinação. Um pagamento prévio a um Deus que jamais cumpre o que promete. Uma jornada a um túmulo que abrigava os ossos de uma mulher e as plumas de um anjo.
— William, se Deus ainda não o curou, duvido que a Abençoada Larina o faça.
— Vou pagá-lo pela tarefa.
Garren retirou sua mão. Desistira de quase tudo por William, de bom grado. Só lhe restava seu orgulho.
— Você pode encontrar muitos tolos para fazerem a jornada como seus peregrinos.
A dor contraiu o rosto de William. Com o braço esquerdo, protegeu o estômago, tentando conter o próximo acesso de vômito.
— Não confio... em mais ninguém.
Garren murmurou alguma coisa, nem sim nem não, com a intenção de acalmá-lo.
Abrigou a mão esquelética de William entre as suas, grandes e quadradas.
Muito tempo já se passara desde que William o assumira, um garoto de dezessete anos que ninguém mais queria, velho demais para iniciar um treinamento para escudeiro. Tudo o que era devia a este homem.
William agarrou-se ao braço de Garren e levantou o corpo, quase chegando a sentar. Era cinco anos mais velho do que Garren, mas parecia estar com uns oitenta.
Depois de assegurar-se de que estavam a sós, William estendeu a mão e apanhou um pergaminho dobrado que não era maior que sua mão.
— É para o monge do santuário.
Pegando a mensagem dos dedos trêmulos de William, Garren espantou-se como ele tinha conseguido segurar uma pena para escrever.
A voz de William também estava trêmula.
— O lacre não pode ser violado.
Garren sorriu em silêncio. Mesmo no mosteiro, tinha sido um mau leitor.
William acenou com o braço para chamar sua atenção, forçando uma resposta.
— Por favor. Não tenho mais ninguém.
Garren olhou nos olhos do amigo, e decidiu que, enquanto William respirasse, cederia aos seus pedidos.
— Não quero o seu dinheiro. — Queria dar a jornada de presente ao amigo.
William balançou a cabeça indicando que não, soltando na fronha da cama um novo chumaço de cabelo louro. Sabia que o amigo não tinha dinheiro para ir mais longe que a próxima batalha.
— Aceite-o. Compre-me uma pluma de chumbo.
Um emblema de chumbo de peregrino. Prova da jornada. Um sinal para alardear sua fé. Garren agarrou os dedos de William.
— Trarei algo melhor. Já que não pode viajar até o santuário, trarei o santuário até você. Vou trazer-lhe uma pluma de verdade.
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