A jovem Magdalena, criada atrás das impenetráveis muralhas de uma fortaleza inglesa, não sabe que é filha ilegítima de um poderoso príncipe inglês e sua esposa francesa assassinada, nem que é um peão na guerra entre a Inglaterra e a França desde que saiu do ventre de sua moribunda mãe.
Ela só quer um pouco de emoção em sua vida.
Assim, um dia entra em seu mundo o magnífico Guy de Gervais, um autêntico cavaleiro de brilhante armadura, e a leva em um piscar de olhos.
Para Magdalena se trata de um amor à primeira vista, mas para Guy só importa sua responsabilidade de manter a jovem a salvo até que ela se case com seu sobrinho e cumpra com seu destino político.
Capítulo Um
Carcassonne, 1360.
O interior da cabana, de palha e barro, estava escuro; escuro e frio. Rajadas de vento gélido passavam pelo buraco do teto que servia de chaminé, formando redemoinhos da fumaça das brasas no ar úmido e frio.
Apesar do frio, algumas pulgas saltavam sobre os destroçados juncos que cobriam o chão de terra batida. A menina batia as mãos em uma perna distraidamente, com seu interesse fixo na espumosa superfície do líquido que havia em um prato de louça colocado sobre o chão.
—O que você vê Jennet? — sussurrou com temor tentando interpretar a mensagem mágica que nunca escapava à sua amiga. Jennet, a Louca, sacudiu a cabeça e grunhiu com mais ironia que humor:
—Me chamam “a Louca”, porém tenho mais senso que a maioria das pessoas. Não esqueça nunca disso, minha pequena senhorita.
—Não o farei. — disse Magdalena, preocupada em não ofendê-la em um momento tão importante.
—O que vê? A bruxa começou a recitar com voz inexpressiva:
—Água e uma terra com espaços abertos. Era muito decepcionante.
—Irei a essa terra? — perguntou a menina desejando tirar algum significado da imagem.
—Quem pode dizer? — Jennet, a Louca, cruzou a pernas, levou um frasco de couro aos lábios e bebeu dele um grande gole. —
Quem pode dizer? — secou a boca com o dorso de uma mão enrugada e ossuda. Magdalena sabia por experiência que uma vez que Jennet, a Louca, começava a beber do frasco não havia mais revelações. Desconsoladamente, se pôs de pé sacudindo sua bata holandesa, de cor laranja, nas zonas em que sabia, ainda que não pudesse ver na penumbra, que coisas asquerosas haviam se enganchado.
—Disse que me prepararia um feitiço para que ocorresse algo.
—E o quê gostaria que ocorresse, jovem donzela? — a velha levantou a mão até uma prateleira na parede e baixou uma caixa.
—Qualquer coisa — disse Magdalena. —O que seja. Jennet, a Louca, a olhou na penumbra.
—Algum dia já não terá esse desejo. Chegará um dia em que rezará para que nada mude. Por pior que seja, desejará que não mude, por medo de que o que está por vir seja pior. Magdalena estremeceu.
Com Jennet, a Louca, nunca se podia saber quando suas previsões nasciam de premonições e quando eram simples disparates.
—Dê-me a mão. Obediente, a menina estendeu a mão com a palma para cima e viu como a velha remexia na caixa, escolhia algumas coisas e as colocava sobre sua mão.
Havia mechas de cabelo, ossinhos, um olho de serpente, um dente de gato e um pouco de alguma substância em pó.
Magdalena ficou olhando-os, fascinada e assustada ante aquela clara prova da capacidade da anciã para fazer feitiços
—Deixe-os debaixo de seu travesseiro durante três noites — disse Jennet — e assegure-se de cear somente caldo. O feitiço não funcionará se sua barriga estiver muito cheia.
Magdalena pensou em colocar aquela coleção de coisas sob o travesseiro da cama que compartilhava com sua tia e seu coração se acelerou um pouco, ainda que o riso aparecesse no fundo de sua garganta.
Engoliu o riso, pensando que sua amiga a acharia pouco respeitosa depois de tão impressionante presente, agradeceu à anciã e saiu com cautela da cabana.
Por desgraça, sua cautela não foi suficiente. Lorde Bellair estava parado sobre as muralhas de seu castelo olhando fixamente a obscura mata do bosque de Radnor.
Era daquelas densas e escuras profundidades que teria que vir uma incursão, e a presença de sentinelas nas quatro torres da fortaleza refletia o estado de alerta do castelo.
O dever dos senhores de Marca, e lorde Bellair era um deles, consistia em proteger a fronteira de intrusos oriundos dos vales da Gália.
Os senhores manteriam seus domínios, que se estendia ao largo da fronteira, em nome do rei, e ninguém era mais consciente que lorde Bellair da importância de sua tarefa e da honra que ela implicava.
Naquele dia nublado e ventoso de fevereiro, de todos os modos, este senhor de Marca esperava visitantes pacíficos para uma questão de negócios que o preocupava consideravelmente.
Série Almost
1- Quase uma Namorada
2- Quase uma Dama
3- Quase Inocente
Série concluída