Em uma noite pavorosa, duas meninas de berço nobre são separadas.
Uma delas, Maude, acaba se convertendo na frágil e manipuladora pupila do elegante Gareth, Conde de Harcourt e a outra, Miranda, se transforma em uma astuta e encantadora moleca que ganha a vida como artista itinerante pelas ruas.
Harcourt se encontra casualmente com Miranda e, diante da espantosa semelhança entre as irmãs, inventa um ambicioso plano: fazer com que Miranda ocupe o lugar de Maude e conquiste o rei da França. Ou seja, converter o patinho feio em um lindo cisne. Mas se sair tudo bem, pode ser que Miranda se converta em algo irresistível... inclusive para Harcourt.
Capítulo Um
Dover, Inglaterra, 1591.
A semelhança era extraordinária. Gareth Harcourt, atraído, abriu caminho até situar-se em frente à multidão, junto ao cenário que um grupo de artistas de rua montara no cais do porto de Dover.
Tinha os olhos do mesmo azul da cor do céu; a cútis, da mesma cor creme, e os cabelos, do mesmo tom de marrom escuro, e até os mesmos reflexos avermelhados sob a luz do sol. Mas a semelhança terminava ali, porque enquanto os cabelos escuros de Maude caíam em uma nuvem de cachos, confeccionados diariamente a base de envoltórios e presilhas, os que coroavam a cabeça da acrobata estavam cortados em um corte reto que parecia ter sido feito, mais com o auxílio de uma tigela que com as ferramentas mais sofisticadas de uma cabeleireira.
Gareth contemplou divertido, como a diminuta figura atuava sobre uma estreita viga colocada sobre dois postes a uma altura considerável do solo. Agia naquela altura de seis pés, como se estivesse no chão, fazendo cambalhotas laterais, andando sobre as mãos e realizando saltos mortais para trás, em uma série deslumbrante de manobras que levantavam gritos de admiração entre o público.
Gareth pensou que o corpo de Maude era mais ou menos esbelto, com pequenas diferenças: Maude era mais pálida, mais fina e menos desenvolvida. A acrobata, apoiada sobre as mãos, com a saia laranja brilhante caindo-lhe sobre a cabeça, mostrava umas panturrilhas firmes, vestidas por uma questão de decência em umas calças muito justas, de couro, e a força de seus braços aparecia, quando eles suportavam o peso de seu corpo. Levantou um braço e saudou alegremente antes de voltar a se agarrar à viga com as duas mãos, balançando-se para um lado e dando cambalhotas o tempo todo, mudando a posição das mãos com grande velocidade e fazendo com que sua saia laranja brilhante se convertesse em uma mancha de cor ao representar uma espécie de roda de Santa Catarina.
No alto do giro se jogou para trás, executou um impecável salto mortal, aterrissou sobre os dois pés, se jogou para trás curvando-se como um arco e se endireitou, e sua saia voltou ao seu lugar rodeando-a enquanto fazia uma triunfal reverência.
Gareth se viu aplaudindo com os outros. O rosto dela estava vermelho pelo esforço, seus olhos estavam ardendo, as gotas de suor aglomerando-se em sua ampla frente e um sorriso exultante. Levou dois dedos à boca e assoviou. Aquele som penetrante fez aparecer sem saber de onde, um macaquinho com uma jaqueta vermelha e um boné que ostentava uma pena laranja brilhante.
O animal tirou o boné e saltou intencionalmente entre os espectadores com gestos que pareceram um tanto obscenos para Gareth, que jogou uma moeda de prata dentro daquele boné estendido, recebendo como resposta uma saudação simiesca.
Um menino de uns seis ou sete anos saudou freneticamente a jovem no final do cenário, onde estava sentado, e arrastando dolorosamente um pé disforme, cambaleou para ela. A jovem o pegou imediatamente nos braços e dançou com ele pelo cenário.
Gareth pensou que era extraordinário o modo como imbuía a pobre criança de sua graça e desenvoltura, fazendo-a se esquecer de seu defeito e transformando seu rosto em uma imagem de puro deleite. Irradiava exuberância e energia, e as transmitia ao menino que segurava nos braços. Ao deixá-lo sobre uma banqueta em um canto, seu corpinho encurvado voltou a perder o ânimo, mas ainda sorria quando o macaco voltou saltando ao cenário estendendo o boné.
A jovem virou seu conteúdo em uma bolsa de couro que levava na cintura, jogou um beijo jovial ao público, voltou a afundar o boné na cabeça do animal e com um salto mortal para trás abandonou o cenário.
A semelhança é assombrosa, Gareth pensou outra vez. Em tudo menos na personalidade, se corrigiu.
Maude tinha menos energia que qualquer pessoa que ele conhecia. Passava os dias deitada sobre um divã acolchoado de madeira, lendo folhetos religiosos e aplicando sais ao pequeno nariz, cuja ponta, geralmente, estava rosado. Quando conseguiam convencê-la a se mexer, revolvia tudo, arrastando lenços e xales, rodeada de um acre halo medicinal devido aos infinitos remédios e tônicos para os nervos que lhe dava sua velha enfermeira. Falava com uma voz tão tênue e suave que mantinha sua audiência na expectativa de que não resistiria até o final da frase.
Mas Gareth era consciente de que sua prima, apesar de toda sua aparente fragilidade, escondia sob sua pálida aparência uma vontade de ferro. A jovem Maude sabia perfeitamente como satisfazer seus caprichos, e se tivesse algo que ela ignorasse sobre chantagem emocional, então seria algo que não valia a pena ser conhecido. Aquilo a convertia em uma oponente digna de Imogen...
Série Bracelete Mágico
1- O Sapatinho de Cristal
2- A Rosa de Prata
3- O Cisne Esmeralda
Série concluída